Era uma estação de metro em Buenos Aires. Uma estação imitando as antigas, de paredes em azulejo que faziam imaginar sons de ferro, cheiro de fumo. Só as televisões nos acordavam para este século, mas ela não queria saber das televisões. Sempre via a sua vida como um filme, tão belo, tão intenso, tão dramático, que tinha de olhar da cadeira, muitas vezes, sair do palco para ver melhor. Para descansar da sua inquietude, da sua mente criadora e turbulenta. Os seus olhos eram castanhos-luz, a sua pele castanho-irrepreensível, os seus cabelos castanho-vento. Era só mais um dia em que ela se esqueceria de agradecer a Deus a benção que é cada segundo, mas isso não lhe mudava a gratidão, os olhos fechados em sorriso.
Era uma estação de metro em Buenos Aires. Velha, riscada. Poluída pela imagens fast-life e também por algumas pessoas. Ele não queria saber da estação. Sempre entrava como quem sobre um degrau que leva ao lugar. Os lugares dele eram longe de tudo, mesmo à distância de uma estação. A sua vida era tão obscura, subsersiva, mística, que as luzes fluorescentes daquela estação o faziam não existir... Mas os seus olhos eram castanho-terra, a sua pele castanho-sol, os seus cabelos castanho-selvagem. Era só mais um dia que ele, propositadamente, não agradecia ao seu Deus: nenhuma das suas perguntas tinha resposta.
Em lados opostos, desceram as escadas, acelerados por um som de fundo que adivinhava uma estadia rápida naquele submundo. Corriam e pediam que fosse do seu lado. A chegada ao vão foi simultânea, o que os fixou. Foi imediato: os olhos, os ombros, as pernas, os pés, tudo se beijava - paralelas-mentes. Nunca se tinham visto mas tinham já a sua bolha. Os pensamentos igualaram-se e eles sabiam-no ("eu quero", "eu preciso", "eu não vejo mais nada"). Queriam-se tudo. Não se largaram até o metro aparecer, no lado dele. Ela sonhou que ele não subia e ele permaneceu imóvel, olhando-a por entre as janelas do metro. Chegou o metro dela e ela entrou no desassossego de onde sempre tentava fugir. Quando o aviso das portas a fechar disparou ela voltou ao mundo-matrix e entrou quase que por impulso, quase como quem corre para a pílula azul e não pensa mais nisso. Arrependeu-se ao mesmo tempo que as portas se fecharam.
Assim que ela entrou no metro soube que teria de vê-lo uma vez mais que fosse, a sua mente desassogava-se agora com a ideia de cair nos seus braços. Esperaria por ele na estação seguinte. Esperaria um metro e, se ele não aparecesse, voltaria atrás. O metro que a seguia chegou vazio, e aí ela entrou no metro que regressaria à estação que já era a deles, esperançosa.
O metro partiu e ele ficou imóvel, intenso para dentro. Ele sabia que ela tinha partido arrependida e por isso saiu em corrida pela estação até ao lado dela, segui-la-ia, ela estaria à sua espera. Perdeu um metro mas entrou em corrida no seguinte, como quem corre para os braços de alguém. Não (ha)via mais nada a não ser os seus olhos.
Quando ele chegou à estação, desesperou. Concluiu que ela seguiu caminho e que o melhor era fazer o mesmo. Apanhou o metro no lado oposto e sentou-se, vazio. Mais perguntas, mais silêncio de volta. Estava criando nós de marinheiro em si mesmo quando chegou à estação onde a tivera visto. Ela não estava em lugar algum. Encostou a cabeça ao vidro e pensou que o metro esperara demasiado tempo. Pensou depois que era de uma cigarro e uns minutos de digestão emocional que precisava. Num impulso pulou metro fora e subiu as escadas enquanto teve a sua prmeira resposta: o metro esperara demais para que tivesse a certeza.
Chegada à estação ela sentiu-se ridícula. Ele não estava. Esperou um metro e nada. Quis esquecer, era melhor regressar ao seu caminho. Subiu as escadas para a rua e só o sinal vermelho do cruzamento a fez parar. Ele não lhe saia da cabeça e ela só pensava que aquele vermelho demorava por alguma razão: o Universo sempre tem as suas razões.
No último degrau acendeu o cigarro e olhou para mundo. Ela estava no seu mundo. Não pensou mais, não havia cor, matéria, tempo, que o parasse. Correu para ela. Ela viu-o, em exultação correu para ele.
Deixou de haver exterior. Nesse dia provocaram 5 acidentes, caos metropolitano e uma menina chamada Vega.
aishh, juro que 'vi'.
ResponderEliminaro melhor elogio
ResponderEliminardesencontro feliz! :)
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