19 de setembro de 2011

formatação




Se há coisa que me assusta é o significado de formatação. Formatar é dar uma forma aceite por normas que ninguém no fundo criou, ou mesmo deseja. Formatar algo, desde um cd a uma Pessoa é apagar-lhe as origens, quebrá-lo, modificá-lo de forma a este ser socialmente aceite, cientificamente correcto, moralmente adequado. Assustador. Assustadora esta ideia de padronizar tudo e todos, como se houvesse um qualquer "ente superior" da padronização que manda as directrizes "cá para baixo" para "normalizar" uma situação, uma obra, uma Pessoa. Isto não existe. O normal não existe. A Pessoa, sim existe, na sua individualização, no brilhantismo do seu único código genético e efeitos neste do mundo a acontecer.

Escolho esta associação entre formatação e Pessoa porque vejo a cada dia que passa, a cada momento que olho a sociedade “for-matadora” (o novo acordo ortográfico faz-me sentir que posso dizer tudo) em que vivemos, um novo ritual de passagem à vida adulta. Nesta tribo urbana os rituais de passagem chegam demasiado cedo. No caso da formatação, ritual de passagem à vida adulta/entrada na sociedade, tal verifica-se de forma intensa. Desde cedo são ensinadas as boas maneiras à criança, o que é "certo" e "errado", não por comprometer a liberdade de outrem, mas porque... sim. E a-sim (assim) a criança aprende que temos de fazer isto, devemos fazer aquilo, e porque sim, porque é o que esperam de nós. A criança aprende então relíquias tais como: espreguiçar em público não! Ignorando-se o facto disto e muitas outras respostas metabólicas serem mecanismos biológicos de defesa/protecção do corpo, do nosso corpo, da nossa vida, do nosso funcionamento verdadeiramente natural.

A Escola acompanha a criança durante pelo menos 12 anos de profunda e nada discreta formatação: desde o espaçamento 1,50 até às regras sociais que, se a criança não conhecer, será profundamente excluída. Este sistema educativo, nas medidas em que se encontra, é o maior centro de formatação. Aqui o tal "ente superior" sem cara agarra na Pessoa em tenra idade e dobra, amassa, corrige, avalia, pune até a Pessoa ser "pessoa", robotizada, Discreta, sem quaisquer imaginação ou vontade própria.

Assim que a criança-já-crescida, aprende a fazer os seus deveres, passa então para aquele "semi" que é a faculdade, ou para um trabalho supérfluo (visto não ter o oco canudo), e aqui, nesta fase intermédia, se consciencializa o dever, a escravatura, a importância de ser igual de ser normal. Aqui se começam a pagar os deveres para com a sociedade, em prol de um bem que, no fundo, ninguém no povo usufrui ou irá usufruir.

Quando se chega aos 40 aposto (aqui nos meus 25) que já nem "se dá por ela". Encontramo-nos mais que incluídos, ou seja, formatados, e isto de resolver as burocracias acontece já como se numa valsa durante décadas treinada. Assustador. Assustador esquecer que o bom de uma valsa é aprendê-la e dançá-la só e só se der prazer. Que se não der, depois, antes ou durante temos sempre um mundo de escolhas e caminhos de terra batida que sempre nos levam à melhor paisagem.
O cd que me foi exigido pelos serviços académicos acabou a sua fase de formatação e está pronto para receber a minha Tese de Mestrado.

Aqui e agora calo a minha constante inquietude e tento pensar somente que Sou feliz. Sou feliz por ter escolhido um caminho virado para todos os caminhos de terra batida do mundo. Sou feliz por ter optado por percursos pessoais e académicos onde o "normal" se diz sempre entre aspas.
Ejectar.

5 comentários:

  1. Felizmente nem todos se deixam for-matar e desafiam os que se dizem ser (inteli)gentes, a cada dia que passa. São esses que espero que mudem a mentalidade da sociedade de hoje e façam do mundo, um mundo melhor amanhã!

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  2. Lori, fiquei apaixonada pelo que escreveste!

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  3. Não conheço a autora de tão inspiradoras palavras, apenas "aterrei" neste blog por acaso. Mas quero dizer que adorei cada palavra, cada frase e cada texto que aqui se encontram.

    Muito obrigada por escrever de tal forma, é um prazer puder identificar-me com vários "pensamentes" que aqui se encontram :)

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  4. obrigada, Rita. Uma opinião que não carregue no coração um sentimento por quem escreve é extremamente relevante!

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tem vontade própria